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Três meses após tragédia na Muzema, polícia diz que milícia age de forma mais ‘camuflada’ e investiga possíveis ‘sócios ocultos’

Três meses após o desabamento de dois prédios na comunidade da Muzema, na Zona Oeste, a Polícia Civil do Rio de Janeiro não descarta que milicianos continuem atuando na comunidade, mas de uma forma cada vez mais “camuflada”.

Em entrevista exclusiva ao G1, o delegado Gabriel Ferrando, titular da Delegacia de Repressão às Ações Criminosas Organizadas (Draco), disse que a atuação da milícia na região é feita de forma discreta após a tragédia e que eles estão até terceirizando atividades.

“Eles foram colocados no centro do noticiário contra a vontade deles. A milícia já vem numa fase, atualmente, de evitar uma exposição e responsabilização e isso gerou com que eles [milicianos] se escondessem cada vez mais, tentando ocultar bens, vender propriedades, tudo para fugir de uma eventual responsabilização criminosa”, explicou.

A tragédia do dia 12 de abril deixou 24 pessoas mortas, e a investigação apontou três suspeitos de serem responsáveis pela construção e venda dos imóveis. Dois foram presos e um segue foragido.

Possíveis ‘sócios’

O delegado da especializada também falou na existência de “sócio oculto” das milícias. Ferrando destacou ainda que, na atual fase da investigação sobre o envolvimento de organizações criminosas de milicianos na Muzema, a polícia quer identificar as pessoas que proporcionam lucros a esses grupos.

“A ideia é olhar o problema sobre outro enfoque. É verificar quem são essas pessoas que estão associadas à milícia, quem é um sócio oculto, quem viabiliza o financiamento pra organização criminosa.”

O delegado acrescentou que são pessoas que “sequer pensavam que poderiam ser responsabilizadas.”

Presos e foragido

Dois homens apontados pela polícia como construtores e vendedores dos imóveis estão presos. No dia 18 de maio, Rafael Gomes da Costa, de 26 anos, foi o primeiro a ser detido pelo envolvimento na construção e venda dos imóveis que desabaram.

Outro suspeito, Renato Siqueira Ribeiro foi localizado em uma casa em Nova Friburgo, na Região Serrana do estado, no início de julho. Segundo a polícia, ele mudou de residência “por diversas vezes”, já com investigadores em fazendo buscas.

José Bezerra de Lima, o Zé do Rolo, apontado pela investigação de envolvimento nas obras e na venda dos imóveis da comunidade, está foragido.

Ao G1, a delegada Adriana Belém, titular da 16ª DP (Barra da Tijuca), disse que a polícia espera concluir o laudo técnico em breve. Ela disse que continua ouvindo testemunhas na busca de identificar outros construtores.

“A gente espera concluir esse inquérito em breve. Já avançamos bastante. A gente continua buscando os laudos, todos os dias estamos ouvindo vítimas que perderam parentes e que perderam as casas”, disse

Os três envolvidos foram indiciados por homicídio com dolo eventual, quando se assume o risco de matar.

José Bezerra de Lira, o Zé do Rolo, é suspeito de ser proprietário dos prédios que desabaram na Muzema — Foto: Divulgação

José Bezerra de Lira, o Zé do Rolo, é suspeito de ser proprietário dos prédios que desabaram na Muzema — Foto: Divulgação

Suspeito de intermediar a venda ilegal de apartamentos na Muzema é preso

Suspeito de intermediar a venda ilegal de apartamentos na Muzema é preso

Sobrevivente tenta recomeçar a vida

Um mês após a tragédia, G1 conversou com uma das sobreviventes do desabamento. Na época, Paloma Paes Leme ainda estava internada no Hospital Municipal Miguel Couto, na Zona Sul do Rio, ao lado do filho de 4 anos que foi resgatado junto com ela debaixo dos escombros.

Paloma perdeu o marido, Raimundo Nonato do Nascimento, de 41 anos, e os outros três filhos: Isac Paes Leme, de 9 anos, Pedro Lucas, de 7, e Lauana Vitória Barroso, de 15.

Hoje, Paloma já teve alta médica, mas aguarda um procedimento de cirurgia plástica na perna e anda com a ajuda de muletas. Ainda sem poder trabalhar, ela voltou a morar em Xerém, na Baixada Fluminense. Em entrevista ao G1 ela contou que está vivendo com a ajuda de pessoas que se solidarizaram com a situação dela e criticou o valor do aluguel social oferecido pela Prefeitura do Rio.

“Estou morando numa quitinete em Xerém, tenho que sair com a minha perna inchada pra dar entrada em um aluguel social de R$ 400. Só aqui [em Xerém], eu pago R$ 500. Eles dizem que aluguel social é um benefício e que eu não posso morar pro lado da Baixada, que tenho que morar dentro da cidade do Rio de Janeiro pra arcar com todas as normas”, disse Paloma.

“Eu falei que não tem aluguel nem na Muzema por esse valor de R$ 400. O mais barato lá era, mais ou menos, R$ 650”, completou.

Em nota, Secretaria de Assistência Social e a Subsecretaria de Habitação disse que, atualmente, não houve encaminhamento das vítimas que ficaram desabrigadas com os desabamentos na Muzema para a prefeitura.

As secretarias afirmam também que nenhuma delas teria o perfil para receber Auxílio Habitacional Temporário e que, além disso, as famílias não aceitaram o acolhimento institucional e optaram em ficar em casas de parentes ou amigos.

Sobrevivente de desabamento no Rio diz que não sabe como recomeçar a vida

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Desabamento atinge dois prédios na comunidade da Muzema, na Zona Oeste do Rio — Foto: Reprodução/ TV Globo

Desabamento atinge dois prédios na comunidade da Muzema, na Zona Oeste do Rio — Foto: Reprodução/ TV Globo

Bombeiros trabalhavam com cães farejadores para encontrar sobreviventes nos escombros onde prédios desabaram na Muzema — Foto: Reprodução/TV Globo

Bombeiros trabalhavam com cães farejadores para encontrar sobreviventes nos escombros onde prédios desabaram na Muzema — Foto: Reprodução/TV Globo

Fonte: https://g1.globo.com/rj/rio-de-janeiro/noticia/2019/07/12/tres-meses-apos-tragedia-na-muzema-policia-diz-que-milicia-age-de-forma-mais-camuflada-e-investiga-possiveis-socios-ocultos.ghtml